APAIXONADO POR CARRO...
>> 26 de mar. de 2008
Em meados dos anos 1990, uma importante companhia petrolífera brasileira difundiu um slogan que se tornou conhecido por todos: “Apaixonado por carro, como todo o brasileiro”. Pois é, mas do que uma frase de efeito, esta assertiva é realmente verdadeira. Pesquisas comprovam que poucos povos no mundo gostam tanto do automóvel quanto nós.
A paixão brasileira pelos “autos” nasceu nos anos 1930, desenvolveu-se com mais intensidade a partir da década de 1960 e, há cerca de 25 anos, alcançou o ápice. Um vigoroso mercado, a criatividade dos desenhistas e até os oito títulos mundiais de Formula 1, conquistados por brazucas, terminaram por impulsionar esta verdadeira relação de amor entre os brasileiros e seus “carangos”.
De juventude humilde, Teixeirinha acompanhou esta evolução automobilística do Brasil – dos calhambeques às supermáquinas. Seu provável contato com o “mundo à motor”, no entanto, parece ter-se dado só em meados dos anos 1940, quando o futuro “Rei do Disco” guiaria os primeiros tratores em granjas do interior. Em 1949, seu irmão Osvaldo Teixeira, conseguiu-lhe uma colocação no Departamento Autárquico de Estradas e Rodagens (DAER). A partir daí ele assumiria o comando das pesadas retro-escavadeiras (no sul conhecidas por “patrolas”).
O tempo passou e o jovem que só guiava carros alheios cresceu, prosperou e tornou-se o maior astro da música regionalista do Brasil. Naturalmente, a fama veio acompanhada do dinheiro, o que possibilitou ao cantor realizar um antigo sonho: ter seu próprio automóvel.
O primeiro carro adquirido por Teixeirinha foi comprado em 1960, com a primeira bolada de cruzeiros que o cantor recebeu como prêmio pela exorbitante vendagem do 78rpm “Coração de Luto”. Era uma Kombi, com a qual o artista passou a excursionar.
A Kombi – abreviatura de Kombinationfahrzeug (“Veículo-combinado”, em alemão) – foi o primeiro veículo Volkswagen totalmente fabricado no Brasil. Seu caráter “multiuso” era a grande vantagem oferecida pela perua, que poderia ser utilizada tanto para trabalho, quanto para passeio. O modelo adquirido por Teixeirinha em 1960 era o mais popular deles, o “Standard”, capaz de transportar até 12 passageiros. Com ele, o cantor viajou por quase todo o Rio Grande do Sul acompanhado de seu empresário na época (José Braz de Oliveira) e do gaiteiro (Ademar Silva). Nas portas da van, cartazes anunciavam a presença do artista. Durante alguns anos este foi o veículo “oficial” do “Gaúcho Coração do Rio Grande” e, em 1964, na milonga “Saudades do lar”, ele faria uma menção ao carro:
Quero chegar no meu lar na perua buzinando
Pra ver as ‘criança’ em festa na hora em que vou chegando
Quero matar a saudade que está quase me matando
Agora pára violão, não vê que eu estou chorando!
É provável que o sucesso contínuo de Teixeirinha tenha-o incentivado a ter outros automóveis. Com o tempo, adquiriu vários, chegando a iniciar uma pequena coleção. Depois da Kombi, o “Rei do Disco” comprou um Aero-Willys, um carro luxuoso e potente (ostentava poderosos 110cv). O veículo, projetado pelo norte-americano Brooks Stevens, foi um dos maiores sucessos da fábrica Willys e marcou época na carreira de Teixeirinha, pois apareceu estampado na capa de três discos (“Teixeirinha Show”, “Teixeirinha no Cinema” e num compacto com as músicas “Motorista brasileiro” e “Resposta do Coração de luto”). Não há provas, mas é de se supor que o cantor tenha adquirido dois modelos Aero, um branco e um azul-escuro.
Do luxuoso Aero Willys, Teixeirinha pulou para o “carro-conceito” dos anos 1970: o utilitário Veraneio (o de Teixeirinha tinha a placa amarela de código YA 2300). Produzido desde 1964 no Brasil, o modelo era capaz de transportar até seis pessoas. Amplamente utilizado como viatura de polícia e ambulância, o carro da Chevrolet também se tornou um dos preferidos pelos artistas de todo o Brasil. O motivo de tamanho sucesso era simples: além de luxuoso, o Veraneio era potente (149cv). Infelizmente, para os gaúchos este carro reporta o fim da carreira do cantor José Mendes, tragicamente morto a bordo da “camioneta” em 1973 e, um ano depois, homenageado por Teixeirinha com a canção “Alma penosa”:
O José Mendes tombou com seus companheiros
A Veraneio espatifou-se na estrada
Não teve tempo, nos momentos derradeiros
De dar adeus ao seu filhinho e a sua amada
Ainda falando de carros práticos, Teixeirinha possuía também uma Ford Belina, outro carro confortável, potente (chegava a 135km/h), capaz de transportar algumas centenas de litros no porta-malas e, principalmente, um automóvel econômico (12km por litro). A Belina pertencia à família Corcel e foi um dos carros mais populares dos anos 1970. Como não encontramos nenhuma foto ou menção de que este fosse mais um veículo de trabalho do cantor, podemos supor que a “station wagon” ficasse mais tempo em poder de um motorista particular, responsável por transportar as filhas e a esposa de Teixeirinha em Porto Alegre.
Fechando a coleção, três carros emblemáticos. Do primeiro (um Opala), não se tem muitas informações – tudo o que se sabe é que, em meados dos anos 1970, Teixeirinha e Mary sofreram um grave acidente a bordo dele. Os outros dois, um Galaxie e um Dogde, são mais conhecidos.
O charmoso Opala de Teixeirinha numa das cenas de "Teixeirinha 7 Provas"
O Galaxie LTD de Teixeirinha era vermelho e produzido no Brasil. Fabricado pela Ford desde 1969, a versão era considerada de extremo luxo, possuindo mais de 5 metros de comprimento, painel em madeira, bancos que mais pareciam sofás, acabamento das portas em couro e câmbio hidráulico (automático). O carro, um sonho de consumo, vinha equipado de série com motor v8 e alcançava mais de 160 km/h, um absurdo para os padrões da época.
O outro “carrão” de Teixeirinha era o também famoso (e luxuoso) Dogde. Assim como o Aero, deste Teixeirinha teve dois: com um (o vermelho) o cantor gravou o filme “Meu pobre coração de luto”; o outro (em versão “sport”) aparece em “A quadrilha do Perna-Dura”. Os Dogde eram verdadeiros xodós – principalmente o vermelho. Aliás, apesar de alguns pensarem que este carro é o mesmo que aparece na canção “A Fazendinha”, a data em que a milonga foi gravada aponta o contrário. Lançada em 1971, a música provavelmente se refere ao Galaxie LTD citado anteriormente:
Eu outro dia no carro vermelho
Saí a fim de matar a saudade
E fui rever a velha fazendinha
Onde passei a minha mocidade
Dogde no filme "Meu Pobre Coração de Luto"
Curiosamente, quase todos os carros citados se tornaram famosos. Com exceção da Belina, todos eles aparecem em fotos conhecidas, capas de discos ou em trechos de filmes. Outra coincidência: todos os automóveis foram fabricados no Brasil. Sim, para Teixeirinha, a indústria automobilística brasileira era a melhor e, por isso, ele preferia comprar carros de fabricação nacional. Brasileiros, ágeis, velozes e bonitos: assim tinham que ser os “possantes” do “Rei do Disco”. É, faz parte da paixão...
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