ELE GRAVOU TEIXEIRINHA, MAS FOI ESQUECIDO

>> 21 de set. de 2007

CD dedicado a Teixeirinha na coleção Raízes dos Pampas:
Jorge Camargo também foi homenageado


Mais do que uma honra, o ato de gravar músicas compostas por Teixeirinha sempre foi certeza de retorno junto ao público. Cientes disso, não foram poucos os que investiram na obra do gaúcho. A dupla Milionário e José Rico resgatou “Coração de Luto”; o grupo Os Serranos produziu a releitura de “Tordilho Negro”; a dupla Osvaldir e Carlos Magrão foi projetada a partir da regravação de “Querência amada” (num arranjo que se tornou ainda mais conhecido que o original); já Os Fagundes tem até hoje “Tropeiro Velho” como um de seus grandes sucessos.
Outra infinidade de artistas regravou sucessos de Teixeirinha nos últimos anos, mas poucos – aliás, raros – tiveram a oportunidade de gravar músicas inéditas do “Rei do Disco”. Entre os sortudos, Teixeirinha Filho lançou recentemente “Saudades do Paraná”, uma das tantas letras inéditas de Teixeirinha encontradas em fitas cassete gravadas pessoalmente pelo compositor. Outra que teve a honra de pôr sua voz numa canção do “Gaúcho Coração do Rio Grande” foi Berenice Azambuja. Esta, aliás, foi mais além: a música que gravou (“Fandango da Berenice”) foi composta por Teixeirinha exclusivamente para a cantora, que a gravou em 1985.
Mas entre todos estes cantores, um deles foi talvez o que mais tenha gravado músicas inéditas de Teixeirinha. Ironicamente, ele é, hoje, um dos menos conhecidos e raramente é citado. Chama-se Jorge Camargo e não se sabe muito sobre sua carreira. Aliás, confesso que fui motivado a escrever este texto quando descobri que praticamente não há registros sobre a trajetória deste artista.
No site de buscas Google (famoso por encontrar tudo o que se procura) nem um registro. No mundialmente famoso Wikipedia a mesma situação. Até entre as milhões de comunidades no Orkut, nada consta sobre Jorge Camargo. Onde e quando teria nascido? Quantos e quais discos teria gravado? Em que ano teria atingido o sucesso? Nada, absolutamente nada disso é conhecido. Não fosse o amigo Arnaldo Guerreiro – português que mantém um verdadeiro museu da música gaúcha do outro lado do Atlântico – e esta matéria nem estaria sendo escrita.
Investigando aqui e ali, descobri algumas poucas informações. Tudo indica que Camargo gravou seus discos em meados dos anos 1970 em alguma subsidiária (ou talvez na própria) gravadora Copacabana, por onde Teixeirinha também passou. Analisando as canções gravadas por ele, posso supor que era bastante jovem quando se lançou em disco. Seu timbre de voz assemelha-se ao de José Mendes. Sua forma de cantar já é mais contida, próxima mesmo a de Teixeirinha.
Ao todo, Jorge Camargo gravou com exclusividade cinco canções que nunca foram gravadas por Teixeirinha – sendo, portanto, o recordista em gravações de músicas inéditas do “Rei do Disco”. O que me despertou maior curiosidade (e inquietação) foi o boato de que ele e Teixeirinha não mantinham boas relações. Quem primeiro levantou o assunto foi Mary Terezinha em seu livro “A gaita nua”. Mary afirma que Teixeirinha teria boicotado Camargo, exercendo sua influência para impedi-lo de gravar. Uma outra versão diz que os dois não se davam bem porque Jorge Camargo tinha tendências homossexuais, no que Teixeirinha não concordava.
Verdade ou não, o fato é que Jorge Camargo lançou músicas inegavelmente caracterizadas pelo estilo de Teixeirinha. Ao todo, foram cinco canções: “Surpresas da vida” (xote), “Moça de trança” (tango), “De tudo um pouco” (arrasta-pé), “Coração egoísta” (vaneira) e “Cama vazia” (valsa). A maior parte delas tem como tema o amor, a paixão e as desilusões por conta do abandono da mulher amada. Um trecho de “Cama vazia” diz:


Esta noite eu procurei na cama
Os teus braços para me envolver
Os teus lábios para me beijar
O teu corpo para me aquecer


Já este trecho da bonita letra de “Moça de trança” nos mostra elementos do chamado “romance campeiro”, mesclando o amor com os temas gauchescos:



Sentindo a saudade e curtindo a lembrança
Da moça de trança e da pele morena
Do olhar caborteiro e, porém matador
Me mata de dor e de mim não tem pena

Um dia no pago, no romper da aurora
Partiu, foi embora pra outro rincão
Seguido ela volta rever sua gente
Provoca o doente do meu coração



Até a imagem de Jorge Camargo segue uma incógnita na história da música do Rio Grande do Sul (não encontramos sequer uma foto do cantor). Teria morrido? Gravou mais músicas de Teixeirinha? Continuamos sem saber. Seus discos não estão à venda em lugar algum. Sua música está desaparecendo pouco a pouco. Para que se tenha uma idéia, sua provável última menção ocorreu em 1999, quando um dos 25 discos da coleção “Raízes dos Pampas” (EMI Brasil) lhe foi dedicado. A propósito, é deste disco (já esgotado) que saíram as cinco músicas citadas nesta matéria, o que nos faz entender que – sendo esta coleção um agrupamento do que há de melhor na produção de cada artista – podem haver outras canções de Teixeirinha gravadas em outros discos de Jorge Camargo. Onde estão estes discos? Espero que alguém os tenha guardado...

1 comentários:

Anônimo 25 de setembro de 2007 às 06:23  

Ótima matéria! Foi bom relembrar Os Fagundes, Os Serranos, Oswaldir e Carlos e também a Berenice. Parabéns!

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