EIS AÍ O TEIXEIRINHA
>> 13 de jul. de 2007
Há 40 anos, no dia 1º de julho de 1967, chegava às bancas de todo o Brasil mais uma edição da revista “O Cruzeiro”, publicação de maior sucesso na América Latina daquela época. Esta edição se tornaria, para os amantes da vida e obra de Teixeirinha, um documento. Nela, foi publicada uma das mais interessantes reportagens já realizadas sobre o cantor. Nesta semana, comemorando com certo atraso os 40 anos da matéria, apresento – na íntegra – o texto publicado.
Pela extensão do texto, dividi a matéria em duas partes. A primeira chega ao nosso blog hoje. A segunda parte será publicada na semana que vem. As imagens que vão ilustrar as postagens são fotos da própria reportagem. Dadas as devidas explicações, vamos viajar no tempo e voltar ao ano de 1967 com a matéria:
UM HOMEM... UMA VIOLA... EIS AÍ O TEIXEIRINHA
(Texto de Marco Antônio Montandon – Fotos de Manoel Costa – Da sucursal de O CRUZEIRO em São Paulo)
Ele é baixinho, gordinho e está longe de ser um “pão”. Quando pega da viola, suas músicas falam de milongas, rasqueados, rancheiras e desafios. Não manda ninguém para o inferno, mas é bem possível que seus discos sejam tocados até lá. Porque Teixeirinha é cantor da intimidade dos Estados Unidos, Espanha, Uruguai, Argentina, Venezuela, Colômbia, Portugal e Colônias. Senhoras e senhores, fiquem sabendo: o gaúcho Teixeirinha é o cantor que mais vende discos no Brasil e fora dele – já deixou longe a casa dos quatro milhões. Só uma sua música – “Coração de Luto” – tem carreira igual aos sucessos de Frank Sinatra, com dois milhões de cópias já vendidas por aí. O que qualquer outro cantor brasileiro nunca conseguiu e talvez nunca consiga.
Já fazia uma hora que o moço de olhinhos miúdos e caprichado bigode cismava coisas sentado na sala de espera do hotel de Passo Fundo. De vez em quando os olhinhos fechavam-se mais, quando se abriam deixavam escapar algumas lágrimas. O moço chorava. Teixeirinha conta que recordou, chorou e escreveu durante uma hora e meia, para criar o maior sucesso musical de vendas do Brasil, “Coração de Luto”.
Naquela hora e meia, Teixeirinha diz que recordou sua vida. As lembranças guardadas do “Seo” Teixeira, da Dona Ledorina, do ranchinho lá em Rolante, no Rio Grande do Sul, dos irmãos que quase não chegou a conhecer. Do Oswaldo, da Geny e da Anilda, todos dados pequenininhos ainda a famílias da cidade, que a fome era maior que o amor.
Lembrou da vida dura e de sofrimentos de rolante, mais dura e de sofrimentos depois da morte de “Seo” Teixeira e do adeus dos irmãos. Quando então mãe e filho foram parar numa fazenda de Santo Antônio, onde conseguiram empregar-se. A mãe Ledorina capinando roça, apesar de sofrer de epilepsia. E tentando arranjar escola para aquele filho já de nove anos, que ainda não sabia ler e escrever. Nem escrever o próprio nome, Victor Mateus Teixeira.
Em 1937, conseguiu Dona Ledorina matricular o seu Teixeirinha na escola da roça. E aquele deveria ser o primeiro dia de aula. Teixeirinha saiu cedo, pediu benção à mãe e foi para a escola. Dona Ledorina ficou em casa, ia fazer o de-todo-o-dia: varrer o quintal, juntar o lixo num montinho e depois tacar fogo. Ela varreu, juntou o lixo e botou fogo. Aí veio o ataque epilético. Dona Ledorina caiu bem dentro da fogueira, quando foi retirada, ainda com vida, não parecia mais gente.
Ao voltar da aula, o menino Teixeirinnha estranhou o movimento em torno do ranchinho. E nem quiseram deixá-lo entrar para ver a mãe. Foi ela quem mandou chamá-lo. E enquanto tomava na sua a mão do filho, lhe disse: - “Meu filho, tua mãe vai morrer. Tu vai ficar por aí rolando, passando fome, e vai apanhar dos estranhos quando tu for rebelde. Faço um pedido: quando tu tiver fome, não roubes para comer. Não juntes uma laranja do chão sem pedir para o dono. Não traia o pensamento de ninguém que tiver confiança em ti. Reze para Deus que ele te ajudará.
- Todo ano, no Dia das Mães, eu cantava alguma coisa lembrando minha mãezinha. Cantava por cantar, sem preocupação de guardar a letra. Até que um dia resolvi compor bem direitinho o “Coração de Luto”. Eu estava num hotel de Passo Fundo e levei hora e meia, lembrando, chorando e escrevendo. Não acreditava no seu sucesso, só queria demonstrar o meu sentimento e a dor de ter perdido minha mãezinha.
Foi assim.
Quando um engano pode mudar uma vida
Teixeirinha nem sonhava em se tornar o maior vendedor de discos do Brasil, trabalhava como operador de máquinas no DER, abrindo estradas pelo Rio Grande. Já tinha seis anos de firma, viola e violão eram divertimento dos domingos. Nunca havia faltado ao serviço, de modo que até estranhou quando recebeu a notícia de que havia sido despedido. Aconteceu que a mocinha do escritório confundiu o seu nome com o de Victor Silveira, um operário meio folgado. Quando deram com o engano, mandaram chamá-lo de volta, aí ele não quis, a dupla Teixeirinha e Antoninho da Rosa já era sucesso em Erechim, Passo Fundo, Lajeado.
A dupla não ficou muito tempo junta. Antoninho da Rosa, sanfoneiro, ficou louco assim de repente. Quando os enfermeiros do hospício foram buscá-lo, ele exigiu um carro da Radiopatrulha porque, sendo de rádio, não viajaria em qualquer carro comum. Tinha de ser um da Radiopatrulha. Sozinho de novo, Teixeirinha resolveu percorrer o Rio Grande. Recebia muitas cartas, todas pedindo para que gravasse suas músicas.
- Era 1959, eu nunca tinha gravado e também não tinha coragem. E depois, nenhuma gravadora queria saber do meu gênero de música. Até que o Palmeira da Chantecler arrumou para eu gravar um 78. Só foi no terceiro disco que gravei o “Coração de Luto”. Hoje tenho gravadas quase duzentas composições, 25 compactos e 17 LPs. E agora vou voltar a gravar o “Coração de Luto”. Desta vez com orquestra. E também em castelhano. Estão me pedindo...
O coração que dominou as paradas
Não, o Brasil não havia visto nada parecido ainda. É verdade que os críticos e entendedores da música popular se encontravam meio abalados, com o extraordinário sucesso de outras duas canções, até então detentoras do recorde de vendagem: “Manolita”, com Osny Silva, e “Índia”, com a dupla Cascatinha e Inhana. Mas o que estava acontecendo com o “Churrasquinho de Mãe” era a mais completa e total alienação. Tava todo mundo doido. E quando mais falavam, mais o povo comprava.
Na Av. São João, em São Paulo, faziam-se filas em frente às lojas de discos. Só na capital paulista eram vendidos dez mil, diariamente. A Chantecler chegou a parar toda a produção, durante meses só prensou discos do “Coração de Luto”. E os 78 r.p.m., que então custavam 90 cruzeiros eram vendidos a até 200 no câmbio negro.
No Rio de Janeiro, quando o representante da Chantecler foi oferecer o sucesso a um proprietário de uma loja de Copacabana, recebeu a resposta de que aquela loja não trabalhava com porcaria. Dias depois, o proprietário telefonava aflito ao representante e pedia: - Me mande logo esta porcaria do Teixeirinha que o povo está invadindo minha loja.
NÃO PERCA A CONTINUAÇÃO DESTA REPORTAGEM NA PRÓXIMA SEMANA!
TEXTO: Chico Cougo Jr.
AGRADECIMENTO: Nicole Reis (que disponibilizou a reportagem)
Pela extensão do texto, dividi a matéria em duas partes. A primeira chega ao nosso blog hoje. A segunda parte será publicada na semana que vem. As imagens que vão ilustrar as postagens são fotos da própria reportagem. Dadas as devidas explicações, vamos viajar no tempo e voltar ao ano de 1967 com a matéria:
UM HOMEM... UMA VIOLA... EIS AÍ O TEIXEIRINHA
(Texto de Marco Antônio Montandon – Fotos de Manoel Costa – Da sucursal de O CRUZEIRO em São Paulo)
Ele é baixinho, gordinho e está longe de ser um “pão”. Quando pega da viola, suas músicas falam de milongas, rasqueados, rancheiras e desafios. Não manda ninguém para o inferno, mas é bem possível que seus discos sejam tocados até lá. Porque Teixeirinha é cantor da intimidade dos Estados Unidos, Espanha, Uruguai, Argentina, Venezuela, Colômbia, Portugal e Colônias. Senhoras e senhores, fiquem sabendo: o gaúcho Teixeirinha é o cantor que mais vende discos no Brasil e fora dele – já deixou longe a casa dos quatro milhões. Só uma sua música – “Coração de Luto” – tem carreira igual aos sucessos de Frank Sinatra, com dois milhões de cópias já vendidas por aí. O que qualquer outro cantor brasileiro nunca conseguiu e talvez nunca consiga.
Já fazia uma hora que o moço de olhinhos miúdos e caprichado bigode cismava coisas sentado na sala de espera do hotel de Passo Fundo. De vez em quando os olhinhos fechavam-se mais, quando se abriam deixavam escapar algumas lágrimas. O moço chorava. Teixeirinha conta que recordou, chorou e escreveu durante uma hora e meia, para criar o maior sucesso musical de vendas do Brasil, “Coração de Luto”.
Naquela hora e meia, Teixeirinha diz que recordou sua vida. As lembranças guardadas do “Seo” Teixeira, da Dona Ledorina, do ranchinho lá em Rolante, no Rio Grande do Sul, dos irmãos que quase não chegou a conhecer. Do Oswaldo, da Geny e da Anilda, todos dados pequenininhos ainda a famílias da cidade, que a fome era maior que o amor.
Lembrou da vida dura e de sofrimentos de rolante, mais dura e de sofrimentos depois da morte de “Seo” Teixeira e do adeus dos irmãos. Quando então mãe e filho foram parar numa fazenda de Santo Antônio, onde conseguiram empregar-se. A mãe Ledorina capinando roça, apesar de sofrer de epilepsia. E tentando arranjar escola para aquele filho já de nove anos, que ainda não sabia ler e escrever. Nem escrever o próprio nome, Victor Mateus Teixeira.
Em 1937, conseguiu Dona Ledorina matricular o seu Teixeirinha na escola da roça. E aquele deveria ser o primeiro dia de aula. Teixeirinha saiu cedo, pediu benção à mãe e foi para a escola. Dona Ledorina ficou em casa, ia fazer o de-todo-o-dia: varrer o quintal, juntar o lixo num montinho e depois tacar fogo. Ela varreu, juntou o lixo e botou fogo. Aí veio o ataque epilético. Dona Ledorina caiu bem dentro da fogueira, quando foi retirada, ainda com vida, não parecia mais gente.
Ao voltar da aula, o menino Teixeirinnha estranhou o movimento em torno do ranchinho. E nem quiseram deixá-lo entrar para ver a mãe. Foi ela quem mandou chamá-lo. E enquanto tomava na sua a mão do filho, lhe disse: - “Meu filho, tua mãe vai morrer. Tu vai ficar por aí rolando, passando fome, e vai apanhar dos estranhos quando tu for rebelde. Faço um pedido: quando tu tiver fome, não roubes para comer. Não juntes uma laranja do chão sem pedir para o dono. Não traia o pensamento de ninguém que tiver confiança em ti. Reze para Deus que ele te ajudará.
- Todo ano, no Dia das Mães, eu cantava alguma coisa lembrando minha mãezinha. Cantava por cantar, sem preocupação de guardar a letra. Até que um dia resolvi compor bem direitinho o “Coração de Luto”. Eu estava num hotel de Passo Fundo e levei hora e meia, lembrando, chorando e escrevendo. Não acreditava no seu sucesso, só queria demonstrar o meu sentimento e a dor de ter perdido minha mãezinha.
Foi assim.
Quando um engano pode mudar uma vida
Teixeirinha nem sonhava em se tornar o maior vendedor de discos do Brasil, trabalhava como operador de máquinas no DER, abrindo estradas pelo Rio Grande. Já tinha seis anos de firma, viola e violão eram divertimento dos domingos. Nunca havia faltado ao serviço, de modo que até estranhou quando recebeu a notícia de que havia sido despedido. Aconteceu que a mocinha do escritório confundiu o seu nome com o de Victor Silveira, um operário meio folgado. Quando deram com o engano, mandaram chamá-lo de volta, aí ele não quis, a dupla Teixeirinha e Antoninho da Rosa já era sucesso em Erechim, Passo Fundo, Lajeado.
A dupla não ficou muito tempo junta. Antoninho da Rosa, sanfoneiro, ficou louco assim de repente. Quando os enfermeiros do hospício foram buscá-lo, ele exigiu um carro da Radiopatrulha porque, sendo de rádio, não viajaria em qualquer carro comum. Tinha de ser um da Radiopatrulha. Sozinho de novo, Teixeirinha resolveu percorrer o Rio Grande. Recebia muitas cartas, todas pedindo para que gravasse suas músicas.
- Era 1959, eu nunca tinha gravado e também não tinha coragem. E depois, nenhuma gravadora queria saber do meu gênero de música. Até que o Palmeira da Chantecler arrumou para eu gravar um 78. Só foi no terceiro disco que gravei o “Coração de Luto”. Hoje tenho gravadas quase duzentas composições, 25 compactos e 17 LPs. E agora vou voltar a gravar o “Coração de Luto”. Desta vez com orquestra. E também em castelhano. Estão me pedindo...
O coração que dominou as paradas
Não, o Brasil não havia visto nada parecido ainda. É verdade que os críticos e entendedores da música popular se encontravam meio abalados, com o extraordinário sucesso de outras duas canções, até então detentoras do recorde de vendagem: “Manolita”, com Osny Silva, e “Índia”, com a dupla Cascatinha e Inhana. Mas o que estava acontecendo com o “Churrasquinho de Mãe” era a mais completa e total alienação. Tava todo mundo doido. E quando mais falavam, mais o povo comprava.
Na Av. São João, em São Paulo, faziam-se filas em frente às lojas de discos. Só na capital paulista eram vendidos dez mil, diariamente. A Chantecler chegou a parar toda a produção, durante meses só prensou discos do “Coração de Luto”. E os 78 r.p.m., que então custavam 90 cruzeiros eram vendidos a até 200 no câmbio negro.
No Rio de Janeiro, quando o representante da Chantecler foi oferecer o sucesso a um proprietário de uma loja de Copacabana, recebeu a resposta de que aquela loja não trabalhava com porcaria. Dias depois, o proprietário telefonava aflito ao representante e pedia: - Me mande logo esta porcaria do Teixeirinha que o povo está invadindo minha loja.
NÃO PERCA A CONTINUAÇÃO DESTA REPORTAGEM NA PRÓXIMA SEMANA!
TEXTO: Chico Cougo Jr.
AGRADECIMENTO: Nicole Reis (que disponibilizou a reportagem)
1 comentários:
Buenas amigo Chico! parabens pelo teu trabalho o blog ta lindo! rapaz nao tem como voce disponibilizar essa historia em quadrinhos pra gente baixar completa? um forte abraço amigo e continue levando o rei do disco sempre pra frente!
cordialmente
murilo damzio da silva
sao jose dos pinhais-pr
www.campereando.blogspot.com
murilodamazios@yahoo.com.br
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